A história dos países nórdicos, terra dos vikings

Jornal Elipse
9 min readNov 6, 2020

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Por Derick Zheng

Os países nórdicos são referência quanto à qualidade de vida e bem-estar social da população. Além de possuirem um dos melhores índices de desenvolvimento humano entre todos os países do mundo, a história deste grupo, composto pela Suécia, Dinamarca, Islândia, Finlândia e Noruega, é também fascinante. Talvez a mais popular das histórias dos países nórdicos vêm do tempo dos vikings, grandes guerreiros e exímios navegadores dos mares que desbravaram terras longínquas e desconhecidas em busca de tesouros e novos assentamentos. Conheça mais sobre os vikings e sua importância neste texto sobre a história dos países nórdicos!

Bandeiras dos países nórdicos

Fonte: Johan Ramberg / Getty Images

Introdução

Os países nórdicos são compostos por cinco países: Suécia, Dinamarca, Islândia, Finlândia e Noruega. Há ainda os territórios autônomos, como a Groenlândia e as Ilhas Faroé sob soberania da Dinamarca e as Ilhas de Åland, da Finlândia. Esse grupo de países está localizado no ponto mais setentrional da Europa, perto do Ártico, e devido a isto, o clima é rigoroso e com neve frequente nas estações mais frias e ameno nas estações mais quentes. A geografia dos países nórdicos é também composta por regiões montanhosas, com bastante florestas de pinheiros, caracterizados pela alta resistência ao frio e fiordes, passagem natural hídrica para o mar entre montanhas.

Esse terreno natural nórdico propiciou as famosas aventuras marítimas dos vikings à Europa ocidental em busca de tesouros e batalhas dignas. A era viking causou enorme temor nesse período da história europeia, devido aos relatos da brutalidade desse povo desconhecido do norte. Entretanto, com o fim da era viking, surge os modernos reinos nórdicos que serão o alicerce dos atuais países da região. A cultura viking ainda permeava entre os novos reinos e por isso, guerras eram constantes entre eles. Ao estudar a história, pode-se entender como uma região habitada por um povo tão bárbaro com uma cultura baseada em conflitos armados, se tornou um exemplo de alta qualidade de vida para seus habitantes.

Um fiorde na Noruega, país conhecido por ter bastante fiordes

Fonte: Visit Bergen / Girish Chouhan

Os primeiros assentamentos permanentes e o início da era viking

O principal grupo étnico dessa região no extremo boreal são os escandinavos, também conhecidos como nórdicos e como muitos grupos étnicos da época, eram nômades. Entretanto, por volta do século VIII, os escandinavos se instalaram definitivamente na parte mais ao sul deste território, devido ao clima ser menos rigoroso que o norte e também, à pesca, em um oceano que não se congelava, dando origem assim, aos primeiros assentamentos permanentes. A partir disso, se inicia o principal período da história dos países nórdicos, a chamada era viking.

Os vikings eram os escandinavos que, após se assentarem, se tornaram excelentes guerreiros e temidos piratas. Como a geografia era montanhosa, fria e com poucos recursos para suprir uma população crescente, os escandinavos precisavam buscar recursos em outras áreas distantes e selvagens, por isso, a arte da guerra corria no sangue viking para enfrentar qualquer inimigo que o ameaçasse. A costa marítima garantia a vantagem de navegação e por isso, os vikings se especializaram nisso, com seus barcos bem construídos e imponentes.

‘Chamando de Vikings’, obra por Viktor Vasnetsov

Fonte: WikiArt

Uma jornada viking a um monastério inglês em Lindisfarne, por volta de 793, caracterizou a fama bárbara desse grupo. O ataque a um local considerado sagrado e de sabedoria pelos europeus, bem como o massacre contra seus monges e os saqueamentos dos tesouros do monastério, criou a imagem de selvageria dos vikings durante o período, propagando que os vikings não respeitavam o sagrado e depreciavam a sabedoria culta.

Ruínas do antigo monastério de Lindisfarne

Fonte: Undiscovered Scotland

Durante a era viking, várias excursões tiveram resultados similares ao ataque à Lindisfarne, ou seja, esses grandes guerreiros do norte saíam de seus assentamentos e atacavam outras partes da Europa, causando um grande número de saqueamentos e destruição de vilas, monastérios e cidades. Tamanha era a violência dessas excursões que as populações e os reinos criaram métodos e sistemas de defesa para repelir essas invasões, que se tornaram frequentes no período.

Todas as jornadas foram possíveis graças à sabedoria viking sobre os mares. Esse conhecimento empírico levou eles para terras longínquas, além da Europa. Uma das façanhas do período foi realizada por Leif Eriksson, um viking islandês que desembarcou da Groenlândia e chegou na costa leste do Canadá por volta do século XI, o qual batizou o novo território descoberto de Vinland, assim, tornando-se o primeiro europeu a chegar no continente americano, muito antes da infame viagem de Cristóvão Colombo, quase cinco séculos mais tarde.

Estátua de Leif Eriksson, o primeiro europeu a desembarcar nas Américas ao chegar na costa do Canadá no séc. XI

Fonte: Leifur Eiriksson Foundation

Os vikings não só viviam de ataques militares a outras regiões, o comércio também fazia parte das atividades desse grupo. As embarcações marítimas possibilitaram o descobrimento de novos mercados e, consequentemente, novos produtos para serem trocados. Os vikings também eram muito religiosos, não à toa, os europeus que sofreram das invasões deles os chamavam de povo bárbaro pagão, ou seja, um povo que praticava uma religião que não fosse a religião cristã. A religião dos nórdicos era caracterizada pelo politeísmo (a presença de vários deuses) e o sacrifício de animais como oferenda para agradar seus deuses.

À medida que as excursões vikings aconteciam, o descobrimento de novas culturas na Europa passava a influenciar a cultura dos nórdicos. O cristianismo, em particular, gradualmente ganhava popularidade, muito em parte também devido às passagens de monges cristãos que tinham como missão catequizar os povos ao norte e também ao comércio. Essa mudança na religião dos nórdicos os aproximou mais culturalmente da Europa e gradualmente, a cultura viking, de excursões militares bárbaros, de idolatria aos deuses e de desdém ao conhecimento culto, chegaria ao fim.

Fim da era viking e o surgimento dos reinos nórdicos

Com a difusão do cristianismo na cultura nórdica, a região dos países nórdicos passou por profundas transformações para a Idade Média. Assentamentos evoluíram para cidades, como Oslo, capital da Noruega. Houve construção de inúmeras igrejas e outras arquiteturas cristãs; castelos eram erguidos; os mercados nas cidades surgiam. A cultura viking foi substituída por uma cultura mais similar à europeia, com a centralização do poder e a formação de reinos com poderes divinos por um único Deus.

Em 1397, houve a unificação dos reinos da Escandinávia: a Dinamarca, a Suécia e a Noruega, sob um único monarca, cujo novo reino ficou conhecido como União de Kalmar, um grande império nórdico. Isso somente foi possível devido às semelhanças históricas e culturais que os países compartilhavam. A União de Kalmar também abrangia a Groenlândia, a Islândia, as Ilhas Faroé e parte da Finlândia.

No entanto, o novo império nórdico rapidamente demonstrou fragilidades internas e movimentos separatistas sob forte repressão do poder central. Em 1521, a Suécia iniciou uma guerra civil separatista, obtendo êxito em 1523, o que levou ao fim da União de Kalmar, a independência do Reino da Suécia e da fundação do Reino da Dinamarca e Noruega. O Reino da Suécia rapidamente ascendeu à posição de uma potência sob liderança de Gustavo II e se renomearia como Império Sueco em 1611, iniciando um período na história sueca caracterizado por conflitos bélicos constantes, como a vitória na Guerra dos Trinta Anos (que envolveu inúmeras potências europeias), a vitória na Segunda Guerra Nórdica sobre o Reino da Dinamarca e Noruega e a decisiva derrota na Grande Guerra do Norte contra a Rússia, que culminou na dissolução do Império Sueco, perda da posição da Suécia como potência e a anexação da Finlândia pelo Império Russo.

Em 1814, durante as Guerras Napoleônicas, o Reino da Dinamarca e Noruega e o Reino da Suécia firmaram o Tratado de Kiel, que passaria o controle da Noruega para os suecos. No entanto, a Noruega proclamou sua independência e os suecos iniciaram uma campanha militar para a unificação dos dois reinos. A campanha terminou com a Convenção de Moss, quando a Noruega, derrotada, se torna parte do Reino da Suécia, originando os Reinos Unidos da Suécia e Noruega.

Em 1905, a Noruega novamente retoma sua independência de forma pacífica e se torna oficialmente o Reino da Noruega, sob uma monarquia constitucional. Em 1917, em plena Primeira Guerra Mundial, a Finlândia se torna independente do Império Russo e adota o republicanismo como modelo político de governo. Até então, somente a Islândia continuava sendo o único país nórdico que não possuía soberania, mas autonomia do Reino da Dinamarca.

O modelo democrático vigorou nos países nórdicos. Com as questões separatistas resolvidas, com exceção da Islândia, os países em conjunto compartilhavam objetivos em comum, como o desenvolvimento da economia e o reforço da cooperação internacional de forma democrática e justa. Apesar dos conflitos históricos, a origem dos países, os valores e os costumes eram similares. Isso possibilitou um estreitamento das relações entre os países nórdicos, no início do período mais conturbado na história da humanidade, que foi o século XX.

A postura dos nórdicos na Segunda Guerra Mundial

Durante a Segunda Guerra Mundial, as relações entre os países nórdicos tomaram rumos distintos. De um lado, a Dinamarca e a Noruega lutavam contra a Alemanha Nazista. De outro, a Suécia e a Finlândia colaboravam e auxiliavam os alemães de alguma forma no conflito. Essas posturas distintas dos países nórdicos inibiram quaisquer relações amistosas entre eles. Ainda, a ocupação da Dinamarca e da Noruega pelos alemães, a neutralidade da Suécia e o apoio militar da Finlândia com os alemães contrariava a união fraternal dos nórdicos, as semelhanças culturais não os tornou aliados. Próximo do fim da guerra, a Islândia se declarou independente da Dinamarca por plebiscito e se tornou uma república.

Após a Segunda Guerra Mundial, os países nórdicos precisavam se reconstruir. O Plano Marshall, um grande alívio econômico dos americanos, contribuiu para a reconstrução desses países. Apesar de terem se dividido no conflito, os países nórdicos não se atacaram, mas se auxiliaram da forma que puderam. A Suécia não auxiliou a Noruega contra a invasão alemã, mas abrigou milhares de refugiados do país vizinho. A Finlândia somente colaborou com os alemães na ofensiva contra os soviéticos, afinal, os soviéticos haviam invadido o território finlândes no início da guerra, então havia um sentimento revanchista.

O período pós-guerra

Os países nórdicos

Fonte: Jeremy Bender/Google

A segunda metade do século XX para os países nórdicos pode ser caracterizado como uma retomada das relações fraternais entre eles. As similaridades culturais e a localização geográfica novamente os reaproximaram e ainda, a democracia, forma de governo adotada por todos eles, contribuiu para uma firme cooperação internacional baseada em valores humanistas. Enquanto o mundo estava dividido entre duas ideologias lideradas pelos Estados Unidos e a União Soviética, os países nórdicos voltaram suas prioridades para si mesmos.

As políticas econômicas e sociais que foram implementadas nesses países posteriormente ficaria conhecido como modelo nórdico. Se caracteriza por um Estado de bem-estar social, porém, com grande ênfase no capitalismo de livre mercado. Isso significa que ao mesmo tempo que o Estado provê serviços públicos de alta qualidade, como saúde, educação e transporte sob uma alta carga de impostos, os cidadãos também usufruem de uma liberdade para seguir suas carreiras à medida que o livre mercado oferece oportunidades. Tal modelo contribuiu para uma elevação da qualidade de vida desses países aos mais altos níveis, um exemplo a ser seguido pelo resto do mundo.

Conclusão

A história dos países nórdicos sem dúvidas, forjou as bases para a união deles na era contemporânea. A origem viking em comum entre eles criou uma identidade cultural compartilhada, com isso, os valores dos países são extremamente similares e a proximidade geográfica também contribui para isso. Com tantas semelhanças, não é surpreso notar que esse grupo tenha índices de desenvolvimento parecidos. Atualmente, esses índices são um dos mais altos do mundo, graças ao modelo de desenvolvimento adotado por eles, que foi cunhado de modelo nórdico. Em suma, ainda que existam cinco países no grupo, é válido dizer que são poucos pontos que os distinguem.

Texto revisado por Daniella Peixoto Pereira

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